Uma pequena reflexão nesta quaresma, para que não percamos a esperança de que Deus não nos abandona.Por mais que nos deixemos levar pelos encantos do mundo,pelo fascinio do poder do dinheiro e assim esquecendo os mais humildes.
Deus nos restaura,nos faz forte,mas somente quando tiramos realmente as sandálias dos pés....
MoisésTão rica é a personalidade de Moisés que podemos tê-lo como nosso espelho. É um gigante com pés de barro. Era belo aos olhos de Deus, mas, ele mesmo tinha uma autoimagem negativa, baixa estima de si mesmo. Cheio de limitações torna-se o grande libertador do povo, enfrenta o faraó e o vence, tudo pelo poder da graça de Deus. Esta é uma velha política de Deus: fazer maravilhas com pessoas pequenas, fracas, defeituosas.
O nascimento e infância de Moisés foram um prodígio. Nasceu forte, agraciado, formoso e logo abandonado nas águas. A Providência divina o salvou através da própria filha do faraó e pela proteção das parteiras que deveriam matar as crianças do sexo masculino. Quem irá um dia afogar-se nas águas, será o exército do faraó. Moisés pela fé, faz brotar água do rochedo e as águas do Nilo se transformam em sangue, e à beira do poço vai encontrar sua futura esposa. Desde o útero materno até o fim da vida, Moisés está sob as asas amorosas e as mãos poderosas de Deus e sempre agindo em favor do povo.
Cheio de ira profética, Moisés mata um egípcio que agredia um hebreu. Ele vê, sente e se comove com a opressão e a injustiça. Agora, como assassino, foge, se esconde, vai viver como foragido e forasteiro. Casa-se e será subalterno, dependente, escravo do seu sogro. Aquele que fora salvo das águas, agora está na aridez do deserto, no silêncio e na meditação.
Moisés tem dois filhos. Gerson, que quer dizer fugitivo, estrangeiro, hóspede, forasteiro. Eliezer, que quer dizer o Senhor é minha proteção, força e segurança. Esta é a vida de Moisés e a nossa. De um lado, problemas, sofrimentos e do outro lado, bênção, força, esperança. Estes são também nossos dois filhos.
Moisés se esconde, mas, Deus o procura, o conhece pelo nome e o atrai para si. No fenômeno da sarça ardente, Moisés fez a mais profunda experiência do amor de Deus, que jamais se consome. Deus ama o pecador e faz tudo para recuperá-lo. Não só, mas, Deus chama Moisés pelo nome. Somos inesquecíveis para Deus e Ele sempre se lembra de nós, chama-nos pelo nome. O amor de Deus é incondicional e toca o fundo do poço onde podemos ter caído. Seu amor é ardente, inflamado, apaixonado. É sarça ardente que não se consome.
Deus dialoga com Moisés e pede que ele tire as sandálias. É preciso tirar a imagem negativa de si, tirar a culpa, tirar os apegos e seguranças falsas. Que pedagogia extraordinária de Deus, que reeduca e recupera Moisés e o faz ir além do deserto. Cada um de nós pode ir além. Não devemos ficar amarrados, engessados, rotineiros, medíocres. É possível ir além com a graça de Deus. Mas, é preciso tirar as sandálias, renunciar, obedecer, deixar-se moldar, reaprender, recomeçar.
Na sarça ardente acontece o encontro entre o Deus santo, misericordioso, fiel e o homem cheio de fraquezas, feridas, rachaduras, incoerências. Deus sempre dá o primeiro passo, tem iniciativa, vem ao encontro. Deus não perde a confiança no pecador, recupera-o. Moisés, que se achava esquecido e perdido, agora recebe a missão de ser representante, embaixador, enviado de Deus para libertar o povo. Abandonado quando criança e fugitivo no deserto, Moisés torna-se a pedra angular, é o eleito. Deus confia nele, o restaura e envia. Esta é a realidade de milhares de pessoas. Nunca devemos desesperar. Há sempre uma saída. Moisés foi amado por Deus e pelos homens. Homem, limitado e líder, humilde e forte, profeta e místico. Jesus, o novo Moisés é a plenitude da vida e salvador do mundo inteiro, pelo amor.
DOM ORLANDO BRANDES é arcebispo de Londrina